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São Paulo

03/03/09 - Ação do MPF visa responsabilizar autores da morte de Manoel Fiel Filho

Operário foi morto em 1976 por agentes do Doi-Codi após torturas; ação visa também responsabilizar civilmente autores da farsa que indica suicídio como a causa da morte

O Ministério Público Federal em São Paulo ajuizou ontem ação civil pública com pedido de liminar para que sete servidores públicos estaduais que participaram da prisão ilícita, torturas, morte e da ocultação das reais causas da morte do operário Manoel Fiel Filho sejam declarados civilmente responsáveis por essa seqüência de violações aos direitos humanos. O assassinato ocorreu no Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna (Doi-Codi) do II Exército, em São Paulo, em 17 de janeiro de 1976.

A ação pede a declaração judicial da responsabilidade pessoal dos réus pela perpetração dessa seqüência de violações aos direitos humanos e a condenação à reparação aos gastos da União com indenizações aos parentes da vítima, estimados em R$ 438 mil, além da perda das funções e cargos públicos e a cassação dos benefícios de aposentadoria.

O MPF também requer a declaração de responsabilidade em face da União Federal e do Estado de São Paulo pela omissão no caso, com a exigência da adoção de medidas de preservação da memória.

A ação é baseada (a) em dados do livro ``Direito à Memória e a Verdade´´, publicado pela Presidência da República, (b) nos fatos reconhecidos pela Justiça Federal de São Paulo durante a ação indenizatória movida pela família da vítima contra a União em 1979 e (c) nos elementos de prova colhidos no Inquérito Policial Militar conduzido pelo Exército na época.

Manoel Fiel Filho era metalúrgico e foi preso na fábrica em que trabalhava, em São Paulo, em 16 de janeiro de 1976. Os agentes que o detiveram não possuíam mandado de prisão. Sua casa foi alvo de buscas e apreensões, também sem autorização legal.

Levado à sede do Doi-Codi, no Paraíso, testemunhos apontam que foi torturado, vindo a morrer em virtude da violência sofrida. Foi identificado que seus interrogatórios foram realizados pela ?equipe B? do Doi. Seu homicídio foi acobertado pela Polícia Civil, inclusive pelos peritos e médicos-legistas que realizaram a necropsia. Na versão oficial da época Fiel Filho teria se autoestrangulado com um par de meias.

OS RÉUS - Na inicial da ação, o MPF aponta que quatro réus tiveram participação direta nos atos relativos à prisão ilícita, tortura e morte (o que não impede que outras elementos possam surgir no curso da ação). São eles:

a) Tamotu Nakao, que na época dos fatos era tenente da Polícia Militar de São Paulo, chefe da equipe de interrogadores e Oficial de Permanência, participou dos interrogatórios e da acareação entre a vítima e o preso Sebastião de Almeida, durante a qual testemunhas apontam que Fiel Filho recebeu uma paulada na altura do baço;
b) Edevarde José, então delegado de polícia e membro da equipe de interrogadores;
c, d) os soldados da PM Alfredo Umeda, carcereiro que encontrou o corpo, e Antonio Jose Nocette, carcereiro. Para o MPF, ambos, que exerciam as funções de carcereiro no Doi, contribuíram para a morte, pois eram eles que conduziam os presos para interrogatórios e, apesar de cientes da tortura, nada fizeram para impedir a prática ilegal;

A ação aponta que três réus participaram dos atos de ocultação da verdadeira causa da morte:

a) Orlando Domingues Jerônimo, então delegado do Departamento de Ordem Política e Social (Dops/SP), que requisitou o laudo de exame de local e encontro de cadáver e o laudo de exame de corpo de delito e que tomou o depoimento da testemunha Sebastião de Almeida no dia da morte de Fiel Filho, ameaçando-a caso não confirmasse suas declarações anteriores;
b) Ernesto Eleutério, então perito, lavrou o laudo de exame de local e encontro de cadáver e o laudo complementar do Instituto de Criminalística; e
c) José Antonio de Mello, médico-legista que lavrou o laudo de exame de corpo de delito, registrando como causa da morte ``asfixia mecânica por estrangulamento´´, e o posterior laudo complementar no qual afirma não existirem lesões externas no corpo e apontando a hipótese de suicídio para a morte.

O comandante do Doi-Codi na época dos fatos, o coronel reformado Audir Santos Maciel, não é réu nesta ação do MPF, pois já é réu na Ação Civil Pública 2008.61.00.011414-5, que tramita perante à 8ª Vara Federal Cível de São Paulo, sobre a responsabilidade dele e do coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra em crimes contra os direitos humanos ocorridos no Doi-Codi, sob o comando de ambos.

Também não são réus na ação agentes e oficiais envolvidos na morte de Fiel Filho que já faleceram, caso do sargento do Exército Luiz Shinji Akaboshi e do delegado Harim Sampaio, ambos membros da equipe B de interrogadores, do comandante do Exército em São Paulo na época dos fatos, Ednardo D´Avilla Mello, e do coronel Murillo Alexander, que presidiu o IPM.

A presente ação pede que, em eventual condenação, quantias que o coronel Maciel tenha pago pela reparação dos danos que a União suportou, sejam deduzidas do montante devido pelos réus que agora são processados.

CASA DE TERROR - Na ação, o MPF frisa que a morte de Fiel Filho não foi um ato isolado, já que o Doi-Codi ``é uma triste referência na prática de prisões ilegais, torturas, homicídios, desaparecimentos forçados, estupros e ocultações de cadáveres´´, conforme já tratado na ação civil sobre a tortura e morte no Doi, proposta em maio passado e que ampliou o debate nacional a respeito da busca por informações e pela apuração dos crimes cometidos na Ditadura Militar.

``Os réus são todos envolvidos com o funcionamento dessa casa de terror. Ainda que alguns possam ter tido menor participação na perpetração da violência direta em face de Fiel Filho, é inelutável que contribuíram para o resultado com suas respectivas condutas, pois formavam verdadeira quadrilha especializada em prender ilegalmente, seviciar e, muitas vezes, matar suspeitos de dissidência política, tudo em nome do Exército pátrio. Essa prática envolvia desde os carcereiros até os mais altos mandatários do destacamento´´, afirmam os autores da ação, o procurador regional da República Marlon Alberto Weichert e os procuradores da República Eugênia Augusta Gonzaga Fávero, Adriana da Silva Fernandes, Luciana da Costa Pinto e Sergio Gardenghi Suiama.

Estudo das próprias Forças Armadas aponta que o Doi-Codi do II Exército, entre 1970 e 1977, deteve 6.897 cidadãos. Essa mesma publicação, a monografia de autoria de Freddie Perdigão Pereira, ``O Destacamento de Operações de Informações (DOI) - Histórico Papel no Combate à Subversão? aponta que 54 desses presos foram mortos no próprio DOI de São Paulo e 542 pessoas foram ?encaminhadas a outros órgãos´´ (como o Dops).

O relatório oficial da Presidência da República, divulgado no livro ´´Direito à Memória e à Verdade´´, identifica 64 casos de mortos e desaparecidos pelo aparato do Doi-Codi de São Paulo, pois inclui os mortos pelos agentes durante diligências.

DIREITO - A nova ação civil proposta pelo MPF é a primeira ação civil a incidir diretamente sobre um fato específico ocorrido dentro do aparato do Doi. Ela utiliza o princípio do direito de regresso, que prevê que o poder público deve tentar judicialmente obter a reparação dos prejuízos causados aos cofres públicos, por exemplo, por conta de indenizações ou outros custos relativos a má conduta ou crimes cometidos por agentes públicos. Segundo julgados recentes do STF, esse direito de cobrança é imprescritível.

Na sentença favorável à ação movida pela família de Fiel Filho, o então juiz federal Jorge Flaquer Scartezzini, sobre a existência de responsabilidade pessoal dos agentes públicos envolvidos na prisão e morte de Fiel Filho, afirmou ``o direito da Ré (no caso a União) de mover ação regressiva contra seus funcionários que agiram culposamente...´´.

A atuação do MPF nos temas relativos à violação dos direitos humanos durante a Ditadura Militar começou em 1999, quando o MPF recebeu representação de familiares de mortos e desparecidos políticos, reclamando a demora na identificação dos presos políticos enterrados na vala comum do cemitério de Perus, em São Paulo.

Inicialmente restritos a uma atuação humanitária, visando a identificação das vítimas, os procuradores que atuaram no caso, verificaram que o amplo desrespeito aos direitos humanos na Ditadura merece medidas de promoção da verdade e da justiça, além de reparação de danos morais, iniciada pelo Governo Federal no final da década de 90.

A conclusão do MPF e a de especialistas é a de que é necessária a adoção de medidas de Justiça Transicional. Além da reparação, é necessário o esclarecimento da verdade, por meio de Comissões da Verdade, processos judiciais e abertura de arquivos estatais; a realização de justiça, mediante a responsabilização de violadores de direitos humanos e a criação de espaços de memória, visando a não-repetição desses fatos e a perpetuação das práticas de tortura e outros crimes contra os direitos humanos nos dias atuais.

Ação Civil Pública nº 2009.61.00.005503-0, distribuída à 11ª Vara Federal Cível. Leia a íntegra aqui

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15/05/08 - Ditadura: MPF-SP move ação civil contra ex-chefes do Doi-Codi

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