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O desastre

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Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil (9/11/2015)

Entenda o desastre

A atividade de extração de minério de ferro exige a separação do material valioso (o que se vende) do que não tem valor comercial. Nessa separação, o material que não vai ser utilizado (chamado rejeito) tem que ser, conforme a legislação ambiental, armazenado em reservatório, para não causar danos. As estruturas que servem de reservatório são feitas de terra compactada e recebem o nome de barragem.

A barragem rompida no dia 5 de novembro era conhecida por barragem de Fundão. De propriedade da Samarco Mineração S/A, Fundão entrou em operação em dezembro de 2008. Cinco meses depois, em abril de 2009, o lançamento dos rejeitos teve que ser interrompido porque houve forte percolação no talude de jusante do barramento. Os taludes são, por assim dizer, as faces de uma barragem, e o talude de jusante é aquele que fica do lado oposto ao conteúdo do reservatório. É a face inclinada do dique, que “olha” para fora do reservatório, e a percolação nada mais é do que a passagem de material líquido para e pelo interior do maciço do barramento.

A percolação em estruturas desse tipo não é em si um problema. Desde que o sistema de drenagem funcione adequadamente, ao percolar, o líquido será escoado para fora do maciço (a drenagem interna é a "alma" da barragem). Entanto, se os filtros e os drenos falham, esse líquido, ao percorrer o interior do maciço de terra, pode levar para fora material sólido, dando início a um processo erosivo. Foi exatamente o que houve com o maciço da barragem do Fundão em abril de 2009. Houve forte percolação, que abriu um orifício de um metro de comprimento, e o reservatório, que estava em processo inicial de enchimento, foi esvaziado.

Em julho de 2010, foi constatado novo problema na barragem. Dessa vez, houve passagem do rejeito arenoso para jusante do referido dique. O rejeito adentrou o reservatório através da galeria principa, resultando em nova paralisação.

A verdade é que a barragem sofreu, ao longo do tempo, várias paralisações, tendo que passar por diversas intervenções de engenharia. Entre essas obras, foi construído um recuo, não previsto no projeto original e não licenciado pelo Poder Público.

O dia do desastre

No dia 5 de novembro de 2015, aproximadamente às 15h30, aconteceu o rompimento da barragem de Fundão, situada no Complexo Industrial de Germano, no Município de Mariana (MG).

O empreendimento, sob a gestão da Samarco Mineração S/A, empresa controlada por Vale S/A e BHP Billinton, estava localizado na Bacia do rio Gualaxo do Norte, afluente do rio do Carmo, que é afluente do rio Doce.

O colapso da estrutura da barragem do Fundão ocasionou o extravasamento imediato de aproximadamente 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro e sílica, entre outros particulados. Outros 16 milhões de metros cúbicos continuaram escoando lentamente. O material liberado logo após o rompimento formou uma grande onda de rejeitos, atingindo a barragem de Santarém, localizada a jusante, erodindo parcialmente a região superior do maciço da estrutura e galgando o seu dique, após incorporar volumes de água e rejeitos não estimados que ali se encontravam acumulados.

Em sua rota de destruição, à semelhança de uma avalanche de grandes proporções, com alta velocidade e energia, a onda de rejeitos atingiu o Córrego de Fundão e o Córrego Santarém, destruindo suas calhas e seus cursos naturais. Em seguida, soterrou grande parte do subdistrito de Bento Rodrigues, localizado a 6 km da barragem de Santarém, matando 19 pessoas e desalojando várias famílias. Já na calha do rio Gualaxo do Norte, a avalanche de rejeitos percorreu 55 km até desaguar no rio do Carmo, atingindo diretamente várias localidades rurais, como as comunidades de Paracatu de Baixo, Camargos, Águas Claras, Pedras, Ponte do Gama, Gesteira, além dos municípios mineiros de Barra Longa, Rio Doce e Santa Cruz do Escalvado.

No trecho entre a barragem de Fundão e a Usina Hidrelétrica Risoleta Neves (também conhecida como UHE Candonga), a passagem da onda de rejeitos ocorreu de forma mais violenta, acarretando o transbordamento de um grande volume de rejeitos para as faixas marginais do rio Gualaxo do Norte e rio do Carmo, em enorme desproporção à capacidade normal de drenagem da calha desses corpos hídricos, ocasionando a destruição da cobertura vegetal de vastas áreas ribeirinhas, por meio do arrancamento da vegetação por arraste, inclusive com a remoção da camada superficial do solo. Observou-se, também, nessa área, a deposição de rejeitos sobre o leito dos rios e em vastas áreas marginais, soterrando a vegetação aquática e terrestre, destruindo habitats e matando animais.

Após percorrer 22 km no rio do Carmo, a onda de rejeitos alcançou o rio Doce, deslocando-se pelo seu leito até desaguar no Oceano Atlântico, no dia 21 de novembro de 2015, no distrito de Regência, no município de Linhares (ES).

No trecho entre a UHE Risoleta Neves, no município de Rio Doce (MG), e a foz do rio Doce, em Linhares (incluindo o ambiente estuarino, costeiro e marinho), o material seguiu preferencialmente pela calha do rio Doce, provocando uma onda de cheia especialmente em seu trecho médio (desde a confluência do rio Matipó até a divisa MG/ES), decorrente do aumento do fluxo hídrico gerado pelo rompimento da barragem. Esse fenômeno alagou, temporariamente, áreas mais planas das margens, deixando nelas, após a normalização do fluxo, os sedimentos contendo rejeitos de minério. À medida que a onda de rejeitos avançava pela calha do rio Doce, sua força inicial foi-se dissipando, gerando, nesse trajeto, danos associados à poluição hídrica, mortandade de animais e à interrupção do abastecimento e distribuição de água em vários municípios, como Governador Valadares (MG), Baixo Guandu (ES) e Colatina (ES).

O maior desastre ambiental do Brasil – e um dos maiores do mundo – provocou danos econômicos, sociais e ambientais graves e tirou a vida de 19 pessoas. Os prejuízos que se viram às primeiras horas e que aumentaram com o passar do tempo, projetam-se mesmo hoje como um devir que não tem tempo certo para findar. Danos contínuos e, em sua maioria, perenes.

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