06/12/2006 - MPF pede aumento de pena para corretores que lesaram fundação
Além do aumento da pena pelo crime de gestão fraudulenta, o MPF pede a condenação dos dois réus pelo crime de operação de instituição financeira sem autorização, uma vez que, na época, Souza era proprietário da empresa Mercap Serviços Financeiros e Processamento Ltda., que operava na bolsa de valores como terceirizada da Didier CCTVM S.A.
Na sentença de junho deste ano, Souza, hoje um dos donos da corretora Planner CVSA, e Didier foram condenados apenas a 5 e a 3 anos de reclusão, respectivamente, pelo crime de gestão fraudulenta e absolvidos pelo juiz Gilberto Mendes Sobrinho pelo crime de operação de instituição financeira não-autorizada. No entendimento de Mendes Sobrinho, a terceirização não é crime.
Entretanto, na opinião do procurador da República Kleber Marcel Uemura, autor do recurso, a terceirização é ilegal, pois é apenas uma forma de burlar a lei, uma vez que as corretoras só podem operar na bolsa de valores com autorização do Banco Central e da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Para o procurador, quem terceiriza o serviço incide no mesmo crime, como cúmplice, porque permite que uma empresa opere no mercado sem o aval do BC e da CVM.
DAY TRADE - Nos meses de abril e maio de 1994, a Didier realizou negócios em nome de quatro ``laranjas´´ ligados a Souza e Marcos José dos Santos. As operações, do tipo day trade (operações de compra e venda de ações em curto espaço de tempo), tiveram como destinatários finais investidores institucionais, dentre os quais a Fundação Cesp, que tiveram grandes prejuízos.
As operações do tipo day trade, ou front running, são feitas em um dia, por um mesmo investidor e envolvendo o mesmo papel e não são ilegais. Porém, as provas acumuladas pela investigação realizada pela CVM demonstram que o objetivo das operações realizadas pela Didier era obter vantagem indevida com spreads positivos (valorização dos papéis) em detrimento das contrapartes (investidores). Em suma, quem lucrou com a operação foi a corretora e não os investidores da carteira da Fundação Cesp.
O ESQUEMA - Para isso, foi adotado o seguinte mecanismo: a corretora, em nome do grupo de clientes da fundação, realizava repetidas vezes operações de compra e venda de um mesmo lote de ações, obtendo pequenos lucros para as pessoas envolvidas a cada negociação. O sucesso do esquema dependia do relacionamento pessoal entre os operadores responsáveis, isto é, as operações só se efetivavam quando havia entendimento entre compradores e vendedores.
Uma vez havendo o acordo entre compradores e vendedores, os operadores realizavam os negócios, um após o outro, criando um aumento artificial na demanda pelos papéis negociados, influindo nos preços por eles alcançados. Com os preços alterados, a Didier recomprava os títulos e repassava-os a quem quisesse comprá-los de fato.
Dada a natureza dos negócios, fechados no pregão viva-voz, os acertos prévios para garantir o sucesso das operações eram feitos verbalmente, sem deixar registros que permitissem identificar as pessoas que deles participaram diretamente em conluio com a Didier. A quantidade de spreads positivos nas operações demonstra a ocorrência de uma prática que prejudicou os clientes no mercado de ações.
``Houve, portanto, verdadeira fraude destinada a induzir em erro o mercado de ações como um todo, os órgãos fiscalizadores e os finais compradores, que acreditaram que tais operações foram feitas em condições normais de oferta e procura´´, relataram os procuradores da CVM em inquérito administrativo concluído em 1997.
FUNDAÇÃO CESP - Além das operações day trade, a CVM aponta que foram realizadas inúmeras operações que tinham como contraparte a Fundação Cesp. Essas operações, segundo o relatório, responderam por aproximadamente 95% do lucro total da Didier, pouco mais de R$ 1,1 milhão na época.
Segundo o relatório, a estratégia operacional para a venda de ações à Fundação Cesp consistia na compra de ações pela Didier que não apresentavam elevada liquidez e, após um curto espaço de tempo, normalmente pouquíssimos dias, os papéis eram desovados a preços superiores aos das aquisições. Havia a certeza, também, de que existiria um comprador para as ações, no caso a Fundação Cesp, que comprava da Didier papéis de valor aumentado artificialmente.
Laudo pericial elaborado pela CVM demonstra que a Didier sabia quais papéis interessavam à fundação e os comprava antes, repassando-os com ``pedágio´´.``Sabendo da instrução da fundação em adquirir um determinado lote de ações, a ela se antecipavam comprando o referido lote do mercado e a ela revendendo este lote poucos dias depois, sempre com lucro´´, afirma a CVM no relatório.
Marcelo Oliveira
Assessoria de Comunicação
Procuradoria da República no Estado de S. Paulo
11-3269-5068
moliveira@prsp.mpf.gov.br