Empregada doméstica resgatada de trabalho escravo em São José dos Campos (SP) receberá mais de R$ 300 mil de indenização
Atuação conjunta do MPF, MPT e DPU resultou na celebração de acordo com o empregador que garante os direitos individuais da trabalhadora
Foto: Pixabay
Em acordo homologado nesta quinta-feira (21) pela 3ª Vara do Trabalho de São José dos Campos (SP), uma empregada doméstica receberá mais de R$ 300 mil de indenização após ser resgatada da situação de trabalho análogo à escravidão no município.
A proposta foi construída com a participação do Ministério Público Federal (MPF), do Ministério Público do Trabalho (MPT) e da Defensoria Pública da União (DPU), que garantiram inúmeros direitos à doméstica, que foi submetida por 25 anos ao trabalho análogo à escravidão. A empregada foi resgatada em junho de 2021, após denúncias anônimas, e encaminhada a um abrigo municipal. O empregador foi preso em flagrante.
O acordo garantiu, no que se refere à defesa dos direitos individuais da mulher de 46 anos, o valor de R$ 200 mil para a compra de uma casa para a vítima e 80% do valor relativo aos salários dos últimos cinco anos de trabalho, que corresponde a cerca de R$ 70 mil.
A conciliação também garantiu uma pensão no valor de um salário mínimo pelo período de cinco anos e o pagamento da contribuição facultativa ao INSS pelos próximos cinco anos, que cessará caso a trabalhadora estabeleça vínculo de emprego, entre outros itens.
A trabalhadora já havia recebido, no momento do resgate, o pagamento da rescisão trabalhista de aproximadamente R$ 22 mil e a regularização do vínculo laboral dos últimos 25 anos junto ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Trabalho análogo à escravidão - A vítima iniciou a prestação de serviços à família aos 13 anos de idade, para a mãe da atual empregadora. Na última residência, ela trabalhou de setembro de 1996 até o dia do resgate.
Segundo as provas angariadas no inquérito do MPT, a trabalhadora era vítima de restrição de liberdade. A empregada se manteve impedida de qualquer convivência social por mais de duas décadas.
A vítima trabalhava em jornada exaustiva, de segunda a domingo. Ela inclusive era levada para viagens com a família, de forma que pudesse manter a prestação de serviços durante os momentos de lazer dos empregadores.
O empregador alegou que o salário era pago em conta corrente da mãe da empregada doméstica, com quem ela não mantinha contato próximo; na prática, a trabalhadora não recebia qualquer remuneração.
Em abril de 2021, a Polícia Militar recebeu denúncia de maus tratos nessa residência de São José dos Campos. Esteve no local e lavrou boletim de ocorrência, para investigações posteriores. Em junho, a procuradora Ana Farias Hirano obteve decisão cautelar para ingressar no domicílio onde trabalhava a vítima. O MPT, pela procuradora Catarina von Zuben, em conjunto com auditores fiscais do Trabalho, Polícia Federal e funcionários do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas), foi à casa e comprovou as irregularidades, sendo o empregador preso em flagrante e a empregada encaminhada a um abrigo municipal.
A Defensoria Pública da União foi procurada por representantes do MPT e do MPF com o objetivo de atuar no caso para garantir os direitos individuais da trabalhadora no acordo a ser firmado com o empregador. “Foi um trabalho coordenado entre MPF, MPT e DPU, com participação da prefeitura, que ainda fornece abrigo e apoio à vítima”, afirma o procurador da República Fernando Lacerda Dias. “O acordo viabilizou amplo ressarcimento à vítima, que vai ter condições de retomar sua vida plena e autônoma, mas também garantiu segurança jurídica aos investigados, com encerramento de possíveis demandas individual, coletiva trabalhista e penal. Acho que o resultado foi bom para todos".
“O trabalho conjunto entre as instituições garantiu o melhor desfecho possível para garantir direitos que podem ser usufruídos de forma imediata, sem a necessidade de tramitação judicial. Contudo, é importante pontuar que nenhum dinheiro no mundo será capaz de reparar a perda de 25 anos vivendo em condições análogas à escravidão, mas ao menos propiciará condições mais confortáveis de vida à trabalhadora daqui para a frente”, afirma a procuradora Ana Farias Hirano, do MPT em São José dos Campos.
"Foi muito importante a participação das três instituições no caso (DPU, MPT e MPF), cada uma focada nas suas especialidades, pois a atuação em harmonia permitiu a rápida resolução do conflito, restando clara a necessidade de a DPU participar cada vez mais desse tipo de ação integrada com os demais órgãos, uma vez que entre suas atribuições está a defesa da vítima e a busca de seus direitos individuais", destacou o defensor público Federal Djalma Pereira.
O acordo firmado entre as partes foi subdividido em três cláusulas com especificidades de atuação da DPU, do MPF e do MPT. A cláusula de “ressarcimento à vítima” foi atribuição da Defensoria Pública da União; o item “termo de ajustamento de conduta trabalhista”, do Ministério Público do Trabalho; e a parte de “acordo de não persecução penal”, do Ministério Público Federal.
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