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Rio de Janeiro

A necessidade da execução provisória da pena restritiva de direito

Autor: Procurador da República Cláudio Chequer. Doutor em Direito Público pela UERJ, coordenador acadêmico e professor do curso de Direito da Faculdade Redentor/Itaperuna. Publicado originalmente no jornal Carta Forense, em 29/09/2017.

Recentemente, no julgamento do HC n° 126.292, de 17.02.2016, o Supremo Tribunal Federal, em decisão festejada por todos que buscam um País mais limpo, sedimentou, em Sessão Plenária e por maioria de 7 a 4, tendo como relator o Ministro Teori Zavascki, o entendimento de que a execução provisória da pena não fere o princípio constitucional da presunção de inocência (art. 5°, inciso LVII, da CR) quando a sentença condenatória for confirmada por Tribunal de Segundo Grau e estiverem pendentes de julgamento o recurso especial ou o recurso extraordinário.

Também por maioria, o Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu que o artigo 283 do Código de Processo Penal não impede o início da execução da pena após condenação em segunda instância e indeferiu liminares pleiteadas nas Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs) 43 e 44, de outubro de 2016.

Esse entendimento recente do STF é diametralmente oposto ao que a nossa Corte Suprema vinha entendendo desde o ano de 2009, orientação então consagrada no julgamento do HC 84.078/MG. Entretanto, segue a mesma orientação que já prevaleceu na jurisprudência do STF desde 28.06.1991, com o julgamento do HC 68.726.

Em diversas oportunidades, as Turmas do STF afirmaram e reafirmaram que o princípio da presunção de inocência não inibia a execução provisória da pena imposta, ainda que pendente o julgamento de recurso especial ou extraordinário. Essa orientação fica, ainda, ilustrada, pelas Súmulas 716 e 717, aprovadas em Sessão Plenária realizada em 24.09.2003, cujos enunciados têm por pressupostos situações de execução provisória de sentenças penais condenatórias.

Para o Ministro Luís Roberto Barroso, quando o STF mudou de posição em 2009 houve uma primeira mutação constitucional sobre a matéria, caminhando-se agora em 2016, com uma nova interpretação a respeito do tema, para mais uma mutação constitucional sobre a presunção de inocência, já que houve mudança de sentido da norma em contraste com entendimento pré-existente.

Para Barroso houve uma alteração na compreensão da realidade social que implicou, por consequência, numa alteração do próprio significado do Direito. Apesar de não ter ocorrido alteração formal do texto da Constituição de 1988, o sentido que lhe deve ser atribuído foi modificado.

A partir da análise do voto condutor do HC 126.292, observa-se que o Ministro Relator considerou que é no juízo de apelação que “fica definitivamente exaurido o exame sobre os fatos e provas da causa” e é na disciplina jurídica da prova que se aplica o domínio mais expressivo de incidência do princípio da não-culpabilidade, concretizando-se, pois, no juízo de apelação, o duplo grau de jurisdição.

Esse entendimento está em perfeita consonância com a Constituição da República uma vez que os recursos de natureza extraordinária não configuram desdobramentos do duplo grau de jurisdição, porquanto não são recursos de ampla devolutividade, já que não se prestam ao debate da matéria fático-probatória. Nas palavras do STF, “com o julgamento implementado pelo Tribunal de apelação, ocorre espécie de preclusão da matéria envolvendo os fatos da causa”.

Em apertada síntese, esse entendimento expressado pelo STF está em conformidade com a Constituição da República porque não compromete o núcleo essencial do pressuposto da não culpabilidade. Há, sem dúvida, restrição a tal princípio, mas essa restrição não é capaz de atingir o núcleo essencial do princípio constitucional da presunção de inocência, sendo uma restrição razoável diante das circunstâncias do caso concreto.

Importante ressaltar aqui, ainda, que o entendimento expressado pelo STF recentemente apenas materializa opinião já aplicada no cenário internacional (Inglaterra, Estados Unidos, Canadá, Alemanha, França, Portugal, Espanha, Argentina, entre outros). Como observou a Ministra Ellen Gracie quando do julgamento do HC 85.866 (DJ 28.10.2005), “em país nenhum do mundo, depois de observado o duplo grau de jurisdição, a execução de uma condenação fica suspensa, aguardando o referendo da Corte Suprema”.

No voto do Ministro Edson Fachin, que acompanhou o Relator e a tese vencedora no julgamento do HC 126.292, ficou expressamente informado, em seus fundamentos, que os artigos 147 e 164 da Lei n° 7.210/84 (Lei de Execução Penal) que poderiam ser interpretados como a exigir a derradeira manifestação dos Tribunais Superiores sobre a sentença penal condenatória para a execução penal iniciar-se, deixam de ser argumento suficiente a impedir a execução penal depois de esgotadas as instâncias ordinárias, porque anteriores à Lei n° 8.038/90, diploma legal que prevê a regulamentação dos recursos extraordinário e especial.

Ora, apesar de ficar claramente demonstrado, pelo inteiro teor do julgado, que o STF admitiu expressamente a execução da pena após a condenação em segundo grau de jurisdição, o Superior Tribunal de Justiça, em decisão proferida aos 14.06.2017 e publicada aos 24.08.2017, através de sua Quinta Turma, em evidente retrocesso, decidiu no sentido de que o entendimento do STF  não se aplica aos casos de penas restritivas de direitos, mas tão somente aos casos de penas privativas de liberdade.

Para o STJ, em entendimento que não se harmoniza com a festejada decisão Plenária de nossa Corte Maior, o Supremo Tribunal Federal tratou apenas sobre a execução da pena privativa de liberdade e não sobre a execução das penas restritivas de direitos.

Dessa forma, para o STJ (AgRg nos EDcl no Recurso Especial n° 1.619.087 – SC), se o réu é condenado em primeira instância a uma pena privativa de liberdade, tem sua condenação confirmada em um juízo de apelação, mas sua pena privativa de liberdade é substituída por uma pena restritiva de direito, esta pena não poderá ser executada após a confirmação da condenação em juízo de apelação.

Segundo o Relator do malsinado julgado no STJ, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, o art. 147 da Lei de Execução Penal impede a execução provisória da pena restritiva de direito.

O que o STJ fez foi ressuscitar o entendimento do STF que vigorava até antes do festejado julgamento de 2016 para justificar agora, momento em que já existe outro entendimento sobre a matéria, que a pena restritiva de direito não pode ser executada antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, utilizando-se como argumento não somente o princípio da presunção constitucional da presunção de inocência, mas também o artigo 147 da Lei de Execução Penal.

Na verdade, todos os dois fundamentos apresentados pelo STJ para justificar a impossibilidade da execução provisória da pena restritiva de direito já foram afastados pelo STF no julgamento do HC n° 126.292. O STF, em Sessão Plenária, já decidiu que a execução provisória da pena, seja ela privativa de liberdade ou restritiva de direito, não ofende o núcleo essencial do princípio constitucional da presunção de inocência, tendo em vista que é no juízo de apelação que “fica definitivamente exaurido o exame sobre os fatos e provas da causa”.

Por sua vez, como manifestado pelo Ministro Edson Fachin, em seu voto no HC n° 126.292, o artigo 147 da Lei n° 7.210/84 deixou de ser argumento suficiente a impedir a execução penal depois de esgotadas as instâncias ordinárias porque anteriores à Lei n° 8.038/90. Ou seja, quando a LEP fez tal previsão, não existiam os chamados recursos especiais e extraordinários.

Dr forma conclusiva, se o STF já admitiu a possibilidade de execução provisória de pena privativa de liberdade, pena muito mais gravosa do que a pena restritiva de direito, é lógico que esse entendimento se aplica às penas menos gravosas de restrição de direitos e de multa.

Basta seguir, aqui, a razoabilidade e um raciocínio lógico. Se pode haver até mesmo a prisão após esgotadas as instâncias ordinárias, por que razão não poderia ocorrer a execução de uma prestação de serviço à comunidade?

A decisão proferida pelo STF no julgamento do HC n° 126.296 impõe, com clareza solar, que seja feita uma interpretação constitucionalizada a respeito do artigo 147 da LEP, que não admite mais uma interpretação meramente literal, empobrecida, leitura essa que terá como pano de fundo esse novo entendimento sobre o que vem a ser trânsito em julgado para fins de execução de uma pena.

 

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