Retrospectiva 2022: Câmara de Ordem Econômica e Consumidor apostou no diálogo para fomentar economia sustentável
Colegiado também trabalhou para aprimorar a saúde suplementar, a proteção de dados e o combate a cartéis
Arte: Secom/MPF
Fomentar o diálogo e a atuação preventiva do Ministério Público Federal (MPF) em prol do desenvolvimento social e econômico do país. Esse foi o principal objetivo da atuação da Câmara de Ordem Econômica e Consumidor (3CCR) em 2022. Seguindo essa premissa, o órgão buscou assegurar os direitos dos consumidores, a qualidade dos serviços prestados à população e a estabilidade da economia. O trabalho foi desenvolvido por meio de eventos e reuniões interinstitucionais, celebração de acordos e elaboração de notas técnicas e recomendações.
Interlocução – Uma das principais frentes de atuação teve como objetivo trazer aos membros do MPF informações técnicas e qualificadas sobre temas relevantes para a economia brasileira. Em abril, foi realizado evento sobre os impactos econômicos, ambientais e sociais da produção nacional de fertilizantes. O assunto ganhou relevância com a deflagração da guerra entre Ucrânia e Rússia, um dos principais exportadores do insumo. Durante dois dias, procuradores da República, representantes dos Poderes Executivo e Legislativo e agentes do mercado debateram questões como a vulnerabilidade gerada pela dependência externa, investimentos na produção mineral, alternativas nacionais, segurança jurídica, preservação ambiental e proteção das comunidades afetadas.
Também com foco no desenvolvimento sustentável, a 3CCR promoveu, em setembro, evento que debateu as oportunidades econômicas na economia verde. No encontro, membros do MPF e representantes dos setores público e privado dialogaram sobre temas como mercado de carbono, o novo marco do saneamento, fomento a projetos e ativos ambientais, gestão de resíduos sólidos e mineração sustentável. O procurador-geral da República, Augusto Aras, marcou presença nos dois eventos.
Negociação – A resolução de conflitos por meio da atuação extrajudicial também foi defendida pela 3CCR no Congresso Nacional. Em audiência pública promovida pelo Senado em março, o órgão afirmou que a criação de fóruns para discutir com antecedência problemas recorrentes no Brasil poderia evitar a propositura de ações judiciais desnecessárias.
A efetividade dessa forma trabalho – baseada na busca da solução consensual para a resolução de conflitos – foi reconhecida pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) ao premiar o projeto Resgate do Direito à Moradia e Dignidade, referente à atuação do MPF no caso do Conjunto Residencial Muribeca, na região metropolitana de Recife (PE).
Construído na década de 80, o residencial popular foi interditado em 2005, após o desabamento de um dos prédios e a constatação do comprometimento da infraestrutura de todo o empreendimento. Milhares de famílias foram prejudicadas e os pedidos de indenização se arrastavam há anos na Justiça. Após ampla negociação e inúmeras audiências mediadas pelo MPF, mais de 2,1 mil famílias foram beneficiadas com o acordo indenizatório, que já totaliza R$ 300 milhões.
Consumidor e Saúde – Outra pauta prioritária foi a defesa da adequada prestação dos serviços pelos planos de saúde. Em junho, a 3CCR cobrou providências da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para assegurar aos usuários com Transtorno do Espectro Autista (TEA) acesso ilimitado a sessões com psicólogos, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos e fisioterapeutas, conforme a indicação médica. Em resposta à recomendação do MPF, a agência reguladora editou normativo ampliando as regras de cobertura assistencial para usuários de planos de saúde com transtornos globais do desenvolvimento, entre eles o TEA.
No mês seguinte, em julho, a diretoria da ANS aprovou resolução que pôs fim definitivo à limitação dos planos privados ao número de sessões e consultas com profissionais especializados. A medida incluiu todos os beneficiários com qualquer doença ou condição listada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), como paralisia cerebral, síndrome de Down, esquizofrenia e outras.
A 3CCR participou, ainda, de seminário que debateu a acessibilidade dos consumidores com deficiência nos setores bancário, de telecomunicações, de transportes e de serviços em geral. O evento foi promovido pela Secretaria Nacional do Consumidor, do Ministério da Justiça.
Superendividamento – A Câmara também esteve atenta às propostas e alterações legislativas com impacto nos direitos dos consumidores e na ordem econômica. Em agosto, o órgão divulgou nota técnica em que pedia a revisão de decreto editado pelo governo federal para regulamentar a Lei do Superendividamento (Lei 14.181/2021). A norma fixou o mínimo existencial – quantia mínima da renda de uma pessoa para pagar despesas básicas e que não pode ser usado para quitar dívidas – em 25% do salário mínimo, o que corresponde a R$ 303. Na avaliação da 3CCR, o valor irrisório definido pelo decreto aumenta a vulnerabilidade dos mais pobres e estimula o superendividamento dos brasileiros.
Com a mesma argumentação, o procurador-geral da República defendeu a inconstitucionalidade da norma federal. Em pareceres enviados ao Supremo Tribunal Federal em novembro, Aras sustentou que, ao fixar o mínimo existencial em valor tão baixo, o Decreto presidencial 11.150/2022 fragiliza as condições adequadas e mínimas de existência digna do consumidor.
Proteção de dados – Dando continuidade ao trabalho iniciado em 2021, a 3CCR buscou assegurar a proteção dos dados pessoais dos usuários do WhatsApp no Brasil. Em parceria com a Autoridade Nacional de Proteção de Dados, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica e a Secretaria Nacional do Consumidor, o órgão divulgou, em maio, análise sobre a conformidade da política de privacidade do aplicativo de mensagens à legislação nacional. O documento aponta que, apesar dos avanços, ainda há aspectos que necessitam de ajuste ou mais estudo.
Outro tema analisado pela 3CCR foi a proposta da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) para padronização do tipo de entrada para carregadores e conectores de celular. Em nota técnica elaborada em agosto, o órgão reconheceu que a padronização deve facilitar a interoperabilidade de dispositivos de diferentes marcas, contribuindo para a redução do lixo eletrônico gerado atualmente. Frisou, contudo, que é necessário assegurar que haja oferta de componentes e peças de reposição de aparelhos mais antigos por tempo razoável.
Ordem Econômica – Para fortalecer o enfrentamento das práticas anticoncorrenciais, a 3CCR atuou na articulação para a criação da Frente Nacional de Combate a Cartéis (FNCC), em agosto. A iniciativa é formada pelo MPF, pelo Grupo Nacional de Combate às Organizações Criminosas do Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais de Justiça e pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
O acordo prevê, entre outras iniciativas, a criação de uma base de dados de julgados do Cade e das Justiças Federal e Estadual para facilitar o conhecimento dos precedentes sobre o direito concorrencial. Estabelece ainda o desenvolvimento de planos coordenados e sistemáticos de atividades entre as instituições. O grupo de trabalho responsável por implementar tais ações foi criado em outubro.
Outro avanço importante foi a edição, pelo Cade, de portaria normativa que disciplina e torna mais ágil a comunicação sobre eventuais práticas de cartel ao Ministério Público competente. Em outra frente, a atuação conjunta das instituições para a resolução negocial de caso envolvendo a prática de cartel no mercado de compras de resíduos animais no Rio Grande do Sul foi premiada pelo Conselho Nacional de Procuradores-Gerais (CNPG).
Composição – A formação do Colegiado da 3CCR foi renovada em junho, quando foi definida a composição do órgão para o biênio 2022/2024. A coordenação continua a cargo do subprocurador-geral da República Luiz Augusto Santos Lima. Também são membros titulares os subprocuradores-gerais Alcides Martins e Rogério Navarro. Como suplentes, atuam o subprocurador-geral Humberto Jacques e os procuradores regionais Waldir Alves e Lafayete Petter.