PFDC envia sugestões ao Tratado Internacional de Empresas e Direitos Humanos que será debatido pela ONU
Tratado será objeto de deliberação durante a 9ª Sessão de Negociação da Organização das Nações Unidas, que será realizada em outubro, em Genebra
Arte: Comunicação/MPF
A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), órgão vinculado ao Ministério Público Federal (MPF), enviou ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania nota técnica contendo sugestões de redação e subsídios para o novo Rascunho do Tratado Internacional sobre Empresas e Direitos Humanos. O texto será objeto de deliberação durante a 9ª Sessão de Negociação da Organização das Nações Unidas, que será realizada em outubro, em Genebra, na Suíça.
A nota técnica reconhece que “um tratado internacional sobre direitos humanos e empresas tem o potencial de incentivar os Estados a aperfeiçoarem suas legislações domésticas, em um esforço de internalização das normas de proteção dos direitos humanos”. A partir da experiência de atuação do MPF, a nota destaca pontos nucleares para a elaboração do tratado: o escopo de redução da impunidade das corporações transnacionais por violações de direitos humanos; a primazia dos direitos humanos, especialmente sobre tratados de comércio e de investimento; a previsão de obrigações diretas para as empresas, e não apenas para os Estados; e a centralidade dos titulares de direitos em quaisquer situações nas quais a atividade empresarial possa lhes afetar, assegurando-se, no mínimo, os direitos à informação, à participação, ao acesso à Justiça e à reparação integral.
Conforme expressa o documento, o objetivo principal do tratado seria preencher as lacunas normativas que atualmente conduzem à impunidade de empresas com atividades transnacionais que infringem a lei. Nesse sentido, a nota técnica sugere que o texto preveja a responsabilidade penal de pessoas jurídicas, a imprescritibilidade da pretensão punitiva estatal e a responsabilidade legal por toda a cadeia de valor para casos de violações de direitos humanos. Com relação à cadeia de valor das corporações, a nota ainda assinala a necessidade do estabelecimento de mecanismos claros para fixar o dever de vigilância da empresa matriz em relação a todas as pessoas jurídicas que a integram.
Experiência brasileira – De acordo com a nota, o Brasil poderia assumir papel de protagonismo nas discussões sobre atividades empresariais e direitos humanos. Por um lado, o campo normativo brasileiro é avançado e impõe determinados padrões de conduta às empresas; por outro, o país ainda se mostra vulnerável a diversas formas de violação, especialmente no contexto de cadeias globais de valor.
Nesse contexto, o documento destaca duas legislações que impõem determinados padrões de conduta no contexto das relações empresariais, como a lei que trata da proteção contra a escravidão contemporânea (Lei 10.803/2003) e a convenção internacional que dispõe sobre a garantia de consulta livre, prévia e informada de povos indígenas e comunidades tradicionais (Convenção 169 da OIT). Para a PFDC, a edição do Tratado Internacional em discussão e a aprovação do Projeto de Lei 572/2022, da Câmara dos Deputados, para a criação de um marco nacional vinculante sobre direitos humanos e empresas, representariam a guinada definitiva no tema.
A nota esclarece que o Brasil dispõe de recursos judiciais e extrajudiciais importantes como instrumentos de responsabilização de atores estatais e não-estatais por ações ou omissões causadoras de danos ao meio ambiente e a violações de direitos humanos. Entre os recursos judiciais, destacam-se as ações penais e as ações civis públicas, já entre os extrajudiciais estão as recomendações e os termos de compromisso e de ajustamento de conduta.
Com base no cenário nacional, especialmente com relação aos resultados favoráveis das ações civis públicas propostas pelo Ministério Público, a nota técnica relaciona como possíveis contribuições ao tratado: a atribuição da defesa dos interesses dos titulares de direitos a entidades públicas fortes e independentes; a isenção de despesas processuais de qualquer natureza às vítimas de violações de direitos humanos (como forma de viabilizar o acesso à Justiça e a busca pela reparação integral dos danos causados); e a previsão de instrumentos processuais voltados à redução da assimetria de recursos e à garantia da paridade de armas em litígios.
A nota é assinada pelo procurador federal dos Direitos do Cidadão, Carlos Alberto Vilhena, e pelo coordenador do Grupo de Trabalho Direitos Humanos e Empresas da PFDC, procurador da República Thales Cavalcanti Coelho. Ambos reforçam a necessidade de um texto assertivo de modo que o tratado possa promover real mudança de paradigma em tema de abuso corporativo. O documento traz, por fim, em seu anexo, sugestões de redação em 24 tópicos.
Acesse a íntegra da Nota Técnica 5/2023/PFDC/MPF.