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Rio Grande do Sul

Geral
3 de Fevereiro de 2020 às 16h40

Nota acerca do instrumento de avaliação unificada da deficiência

Procuradores da República Ana Paula Carvalho de Medeiros, Enrico Rodrigues de Freitas e Fabiano de Moraes fazem parte do grupo que assina a nota

Imagem: Secom

Imagem: Secom

Nós abaixo-assinados, pessoas com deficiência, familiares, entidades representativas, profissionais que atuam no Rio Grande do Sul, em áreas relacionadas, apresentamos nosso posicionamento sobre o Instrumento de Avaliação Unificada da Deficiência.

Desde a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, aprovada pela ONU (2006) e ratificada pelo Brasil (2008), encontra-se em discussão em nosso país um novo Modelo de Avaliação da Deficiência, baseado não apenas na visão biomédica que a entende como uma patologia ou impedimento do indivíduo, mas na compreensão de que a deficiência resulta da interação desta lesão com as barreiras sociais que impedem a participação plena da pessoa na sociedade.

A Lei Brasileira de Inclusão (LBI) – Estatuto da Pessoa com Deficiência estabeleceu que a avaliação da deficiência será biopsicossocial, devendo ser realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar.

O Decreto no. 8.954, de 10/01/2017, criou o Comitê do Cadastro Nacional da Inclusão da Pessoa com Deficiência e da Avaliação Unificada da Deficiência, composto por membros do Governo Federal e do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (CONADE). Esse Comitê elaborou um Instrumento denominado Índice de Funcionalidade Brasileiro Modificado – IFBrM, que se encontra em validação, sendo que mais de 8.000 pessoas já foram avaliadas por profissionais de diferentes áreas, da Rede de Atenção à Saúde do SUS, em 50 cidades distintas das cinco regiões do país, sob coordenação da Universidade de Brasília (UnB). Para a condução desse processo já foram aportados recursos no valor R$ 1.781.725,00, oriundos do Acordo de Cooperação Técnica Internacional, com a Organização dos Estados Iberoamericanos (OEI). No entanto, apesar dos esforços conjuntos para a elaboração e validação do referido instrumento, foi apresentado pela Subsecretaria de Perícia Médica do Ministério da Economia, o Protocolo Brasileiro de Avaliação da Deficiência – PROBAD.

Cabe referir que a Perícia Médica teve representação no Comitê do Cadastro Nacional de Inclusão da Pessoa com Deficiência e da Avaliação Unificada da Deficiência, tendo, no entanto, se afastado das reuniões no decorrer das discussões sem apresentação de qualquer justificativa.

O PROBAD nasce da iniciativa de apenas uma categoria profissional que propõe um Instrumento, sem ouvir os demais segmentos do Governo Federal que também desenvolvem políticas públicas, inclusive do próprio Ministério da Economia. Ressalta-se que a Inspeção do Trabalho, com larga experiência na inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho e com grande participação no Comitê Nacional, não foi em nenhum momento consultada pelos responsáveis por esse Protocolo.

Além disso, o Protocolo rompe com a obrigação constitucional de consultar as pessoas com deficiência na elaboração e implementação de legislação e de políticas públicas (Art. 4, item 3, da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência). A propósito, o CONADE, em reunião ocorrida no dia 23/10/2019, manifestou apoio ao IFBrM, não reconhecendo o PROBAD como instrumento balizado pela Convenção.

O Protocolo apresenta várias outras impropriedades. Dentre elas, destaca-se o predomínio da visão médica, já que ao Médico Perito Federal caberia avaliar o impedimento nas funções e nas estruturas do corpo e, quando entender pela sua inexistência, encerrar a avaliação declarando que a pessoa não tem deficiência, desconsiderando o impacto dos fatores ambientais e das atividades de participação na configuração da deficiência. Rompendo assim com a lógica da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) da Organização Mundial da Saúde (OMS), que permeia a Convenção e a LBI.

Verifica-se nessa proposta hierarquizada nítida intenção de continuar avaliando a deficiência como uma questão médica e restrita à avaliação de uma doença ou sequela. Essa prevalência da visão médica rompe com o próprio entendimento da OMS que destaca a deficiência como complexa, dinâmica e multidimensional, sendo que o ambiente de uma pessoa tem um enorme impacto sobre a vivência e a extensão da deficiência. Essa proposta cria uma hierarquia ilegal que rompe com o comando claro e expresso da LBI de que a avaliação da deficiência deve ser biopsicossocial, realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar. E também, retroage ao reducionismo da visão médica na concepção e avaliação da deficiência, não encontrando guarida no conceito constitucional de deficiência da Convenção.

Por outro lado, o PROBAD, quando propõe que a avaliação das funções e estruturas do corpo seja feita obrigatoriamente por um Médico Perito, exclui vários profissionais da área de Saúde e de outras áreas de conhecimento, como médicos não integrantes da carreira de Perícia Médica (inclusive especialistas como, por exemplo, psiquiatras, neurologistas e médicos do trabalho), bem como psicólogos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, psicopedagogos, entre outros. Esses profissionais estão aptos a avaliar os impedimentos e funcionalidades relacionados à sua área de especialização. Esta questão demostra que o PROBAD tem de fato a intenção de criar uma reserva de mercado para uma categoria profissional federal, utilizando-se para tal de um instrumento de validação da deficiência.

Um país com dimensões continentais como o nosso precisa contar com uma rede de profissionais para avaliar com agilidade e capilaridade as pessoas com deficiência.

O PROBAD não distingue a deficiência intelectual da deficiência mental/psicossocial. Essas deficiências são distintas, têm especificidades e barreiras diversas. A mental/psicossocial ainda tem dificuldade de ser reconhecida como uma deficiência e é confundida com a intelectual. A proposta reforça essa incompreensão, não permitindo identificar situações de maior risco funcional especialmente para a deficiência mental/psicossocial.

Outra grande dificuldade é que as questões relacionadas ao trabalho no PROBAD foram reduzidas a apenas um item. O trabalho, instância fundamental da vida e da construção da identidade social, não pode ter o peso de apenas um dos quarenta e quatro itens na vida da pessoa.

Pelo exposto, manifestamos apoio ao Índice de Funcionalidade Brasileiro Modificado – IFBrM, que foi construído por um grupo de especialistas e pessoas com deficiência, respeitando os ditames legais, científicos e democráticos. Ressalta-se que eventuais ajustes, apontados pelo processo de validação conduzido pela UnB, poderão ser efetuados para tornar o IFBrM um instrumento ainda mais justo e eficaz para a avaliação da deficiência.

Leia a nota aqui

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