MPF recorre de liminar em ação rescisória contra decisão que determinou recálculo do Fundef
Ação civil pública originária já havia transitado em julgado, mas União pediu rescisão de sua execução alegando que a Justiça Federal em São Paulo não seria competente para julgá-lo
Alunos em sala de aula. (Foto: Pulsar Imagens)
O Ministério Público Federal recorreu de liminar que suspendeu os efeitos de uma ação civil pública do MPF que havia determinado o recálculo dos valores mínimos anuais por aluno do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef). Ação havia determinado que a diferença de valores do período de 1998 a 2016 fosse complementada pela União Federal.
A tutela cautelar foi dada em uma ação rescisória movida pelo União, que busca invalidar a decisão da ação originária, do MPF, que já havia transitado em julgado. A decisão é do desembargador Fábio Prieto, relator da rescisória no Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), acolheu os argumentos da União de que a Justiça Federal de São Paulo não seria competente para julgar a ação proposta, uma vez que supostamente o estado e nenhum município paulista receberiam complementos do Fundo.
Criado em 1996, o Fundef foi implantado nacionalmente em 1º de janeiro de 1998. Em 1999, o MPF em São Paulo entrou com uma ação civil pública pedindo que a União recalculasse o valor mínimo anual por aluno, que havia sido fixado em valor inferior ao que deveria ter sido determinado. O recálculo abrange o período entre 1998 a 2006, uma vez que em 2007 o Fundef foi substituído pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb).
A ação foi julgada procedente pela Justiça Federal paulista e confirmada pelo próprio Tribunal, em acórdão de março de 2009, que transitou em julgado depois que os recursos excepcionais da União não foram admitidos pelo TRF3.
Diante disso, a União entrou com uma ação rescisória no ano passado, alegando que a Justiça Federal em São Paulo seria incompetente para julgar a ação, já que nenhum município do estado receberia verbas do FUNDEF. Também alegava que após o trânsito em julgado da ação civil pública em que a União foi condenada, centenas de municípios passaram a requerer a execução da condenação.
Além de acolher tais argumentos, o desembargador Fábio Prieto afirmou, em sua decisão, que o MPF teria agido como “promotor de encomenda”, em ações qualificadas como “espetaculares”, defendendo interesses individuais dos municípios, ressaltando que a ação não deveria ter sido sequer processada. E afirmou, ainda, que o MPF deveria investigar a ação de prefeitos que estariam contratando escritórios de advocacia, por honorários exorbitantes, para executarem a ação em favor dos municípios.
O recurso do MPF
Em seu recurso, bem como na contestação à ação da União, a procuradora regional da República Alice Kanaan mostrou-se surpresa com as afirmações do desembargador. Ela pontuou que não se trata de defesa de bens patrimoniais dos municípios, mas de discussão que claramente envolve direito a uma educação pública de qualidade, constituindo interesse transindividual difuso de abrangência nacional, o que justifica a legitimidade de atuação ministerial.
Ela afirmou ainda que causaria estranheza que a demanda tenha passado pela 1ª e 2ª instâncias da Justiça Federal, inclusive o próprio Tribunal, sem que a legitimidade da ação não tivesse sido enfrentada. No entanto, a procuradora demonstrou que, ao contrário do que agora afirma o desembargador, a legitimidade do MPF em São Paulo para propor a ação foi amplamente reconhecida no decorrer da ação originária.
Isso porque trata-se de um dano potencial, que pode afetar diversos municípios, em abrangência nacional, não havendo a necessidade de existir um dano efetivo, o que torna possível que a Justiça Federal de qualquer estado pudesse julgar uma ação civil pública que discutisse tal dano à educação. Além disso, em seu recurso, o MPF demonstrou que, pelo menos dois municípios do estado de São Paulo (Regente Feijó e Tapiratiba) receberam, sim, verbas do FUNDEF, tendo entrado com ações individuais para o recálculo do valor. Apenas por esse motivo não integraram diretamente o rol de municípios afetados pela ação originária do MPF. No entanto, isso não impede que haja outros municípios no estado paulista que possam eventualmente ter direito a receber tais verbas, com o recálculo a ser feito pelos parâmetros estabelecidos pela ação.
Em relação às notícias de que haveria contratos com escritórios de advocacia terceirizados para entrar com ações de execução em nome de municípios, ressaltou que tal receio já havia chegado a conhecimento do MPF. “É por este motivo que o Ministério Público Federal (MPF), em conjunto com o Ministério Público do Estado do Maranhão (MPE/MA) e Ministério Público de Contas do Maranhão (MPC/MA) requereu, com alicerce, inclusive em decisão advinda de representação feita junto ao do Tribunal de Contas da União – TCU (Processo TC 005.506/2017-4 – anexo em que se questiona a atuação de escritório advocatício terceirizado que está executando o crédito de 105 municípios maranhenses), que aludida destinação (de valores do FUNDEF sejam destinados exclusivamente à educação), o que, em verdade, sempre foi inerente ao pedido da ação civil pública, para que se pudesse preservar o direito constitucional tutelado, com o ajuste dos valores (VMAA) aos patamares mínimos a preservar a educação básica”, informou a procuradora.
Ponderando que gostaria de entender o porquê das infundadas críticas do relator do processo na rescisória à atuação ministerial na ação civil pública de origem, o MPF pontuou que é clara a intenção da União Federal em dar o calote. Por fim, solicitou que a decisão cautelar que suspendeu os efeitos da ação originária seja revertida e que, por fim, a ação rescisória da União Federal seja julgada improcedente.
Processo nº 5006325-85.2017.4.03.0000.
ACP originária 0050616-27.1999.4.03.6100
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