PFDC produz documento com argumentos jurídicos que sustentam realização de aborto legal no Brasil
Documento foi encaminhado ao procurador-geral da República, no intuito de subsidiar sua manifestação na ADPF nº 989, que tramita no STF
Arte: AsscoInf
A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) acompanha com atenção as políticas públicas relacionadas aos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, notadamente no que se refere à realização do aborto legal. Em abril do ano passado, chegou a expedir nota técnica na qual defendeu a adoção da telemedicina de forma parcial, em virtude da pandemia da covid-19, nas etapas de tratamento medicamentoso e acompanhamento pós-tratamento no caso de interrupção voluntária da gravidez decorrente de estupro.
Nesses últimos 30 dias, o Grupo de Trabalho Mulher, Criança, Adolescente e Idoso: Proteção de Direitos (GT-MCAI) discutiu formas de atuação mais eficazes, tendo em vista a dificuldade de mulheres – crianças, adolescentes e adultas - exercerem o direito ao aborto legal em casos decorrentes de estupro. O grupo vinha trabalhando na coleta de subsídios técnico-jurídicos para elaboração de uma possível recomendação, tendo em vista a edição do Manual intitulado “Atenção Técnica para Prevenção, Avaliação e Conduta nos casos de Abortamento”, pelo Ministério da Saúde.
No entanto, como o caso foi judicializado por entidades da sociedade civil, por meio da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 989, o procurador federal dos Direitos do Cidadão, Carlos Alberto Vilhena, decidiu encaminhar o material produzido ao procurador-geral da República, Augusto Aras, a quem cabe atuar na referida ação em nome no MPF.
No documento, Vilhena esclarece que a PFDC não possui atribuição para atuar em juízo e, que considerando o valor jurídico contido na argumentação do GT-MCAI, o propósito do encaminhamento é apresentar subsídios que poderão ser utilizados na elaboração da manifestação na ADPF nº 989 que será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Confira alguns dos principais entendimentos jurídicos levantados:
1) O art. 128, inciso II, do Código Penal, prevê a admissibilidade legal de interrupção voluntária da gestação em caso de estupro, o que significa o respeito pelo Estado à dignidade e à integridade física e psíquica da mulher vítima de violência sexual;
2) A Conferência Mundial sobre Direitos Humanos de Viena de 1993, ratificada pelo Brasil, e a Conferência Mundial da Mulher, realizada em Beijing, em 1995, estabelecem que o direito das mulheres e meninas é parte inalienável, integral e indivisível dos direitos humanos universais, e a violência de gênero, inclusive gravidez forçada, é incompatível com a dignidade e o valor da pessoa humana;
3) O Brasil é signatário da Convenção Internacional sobre População e Desenvolvimento, conhecida como Convenção do Cairo de 1994, na qual se estabeleceu que, nas circunstâncias em que o aborto não contraria a lei nacional, o procedimento deve ser seguro e acessível, em todos os casos, as mulheres devem ter acesso a serviços de qualidade para o tratamento das complicações resultantes do aborto;
4) O Brasil é signatário da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, de 1979, ratificada e promulgada pelo Decreto nº 4.377/2002, que impõe aos Estados-Partes, em seu artigo 12, a obrigação de eliminar a discriminação contra a mulher na esfera dos cuidados médicos, a fim de assegurar, em condições de igualdade entre homens e mulheres, o acesso a serviços médicos, inclusive referentes ao planejamento familiar" e garantir "à mulher assistência apropriada em relação à gravidez, ao parto e ao período posterior ao parto, proporcionando assistência gratuita quando assim for necessário;
5) A Lei nº 12.845/2013 garante "o atendimento imediato, obrigatório em todos os hospitais integrantes da rede do Sistema Único de Saúde (SUS), de serviços de atendimento emergencial a vítimas de violência sexual (art. 3º)" e o Decreto nº 7.958/2013 estabelece as diretrizes para o atendimento às vítimas de violência sexual pelos profissionais de segurança pública e da rede de atendimento aos Sistema Único de Saúde.
O documento cita ainda decisões do próprio STF e diversos estudos, lembrando que o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH), em 2021, informou que a cada duas horas uma menina é violentada no país. No total, foram 5.679 denúncias de estupro contra crianças e adolescentes até 14 anos em 2020, segundo dados coletados dos canais oficiais “Ligue 180” e “Disque 100”.
Reportagem - Allana Albuquerque
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